Por Welter Benicio –

 

Li recentemente um livro de autoria do Albert Einstein, publicado em 1916, onde ele explica de maneira simples e objetiva as teorias da relatividade restrita e geral (Relativity: The Special and General Theory). Já li outros livros sobre o tema, mas este do próprio autor me levou a algumas reflexões. Nele se vê a elegância e simplicidade de uma representação inovadora da realidade que quebra um paradigma e leva a inovações marcantes para a humanidade. Através de uma constatação empírica, ou seja, da invariabilidade da velocidade da luz qualquer que seja o referencial de medição, constrói-se um modelo matemático baseado nas transformações de Lorenz que desnuda o caráter relativo do tempo e do espaço. Divulgar esse modelo e seus resultados naquela época, a meu ver, exigiu muita coragem e autoconfiança. Mas a teoria da relatividade não é caso único. Os resultados da equação de Paul Dirac também apontavam, em 1928, para a existência de antimatéria, um “contrassenso” que só seria confirmado em laboratório em 1995. Em ambos casos, um modelo matemático aponta para uma inovação gigantesca, uma disrupção.

As equações matemáticas da física, com seus símbolos intrincados e indecifráveis para a maioria, nada mais são do que a receita da relação entre fenômenos. “F = m.a” (permissão aos puristas para ignorar a notação vetorial) quer dizer – Se empurrar ou puxar assim, isto vai se mover assado! Muitas vezes, observa-se um fenômeno e propõe-se um modelo que o explica com base em outros fenômenos de maneira determinística sem maiores consequências. Algumas vezes, o modelo descortina novas verdades, como os exemplos deste texto.

No nosso dia a dia, descobrir relações entre fenômenos pode ser mais importante do que criar um modelo determinístico que explique causa e efeito. Se há medições e registros em abundância destes fenômenos e há capacidade de processamento, então pode-se usar a matemática para extrair padrões de comportamento e relações entre eles. Eis aí a inteligência artificial (IA), mais especificamente o ramo do aprendizado de máquina (machine learning e deep learning – ML e DL), que nada mais é do que o uso de ferramentas matemáticas e computação para extrair padrões e relações entre fenômenos sem se preocupar com um modelo que os relaciona de maneira determinística. E o que tem a ver o livro sobre a relatividade e a IA?

A predição de fatos (ex.: quebra de uma máquina e não pagamento de empréstimo), o agrupamento de semelhantes (ex.: produtos recomendados para quem já comprou um outro produto), a seleção (ex.: o promoção direta sobre quem é mais inclinado a comprar meu produto), a decisão (ex.: dar ou não crédito para alguém), inferência (ex.: dado que aconteceu isto, concluo aquilo) entre outros, são tarefas computacionais feitas por programas (algoritmos) baseados em ferramentas matemáticas (geometria analítica, cálculo vetorial, estatística, etc.). Atualmente, é possível encontrar esses algoritmos em prateleira (ex.: Github) e usa-los está cada vez mais fácil. Alguns exemplos de algoritmos são: Support Vector Machine, Linear e Logistic regression, Decision Tree, Ensemble Learning (ex.: random forest), Neural Networks, etc. e etc. É fácil perceber que estamos na infância do tema e que há muito por vir. O que não é tão fácil de se perceber, no entanto, é o potencial de inovação e disrupção da IA. Se o fosse, a grande maioria das empresas já estaria se debruçando sobre seus valiosos dados tentando extrair conhecimento, inovação e até disrupção, o que não acontece.

Assim como as transformações de Lorenz, as ferramentas matemáticas de IA podem mostrar novos caminhos ainda impensados. A título de exemplo, a automatização do processo de análise de risco com a IA pelas empresas de crédito já não é novidade, mas o tema finanças comportamentais ainda é terreno pouco explorado pelas instituições financeiras. Dado que o ser humano é rico em vieses cognitivos que o distanciam do agente racional dos modelos econômicos, que tal oferecer aos clientes gestão financeira completa com base na IA? E há outros exemplos em outras indústrias. Em alguns casos, o caminho mostrado será tão inovador que requererá uma boa dose de coragem do pioneiro, que nele deverá apostar não só sua reputação mas o seu dinheiro. Amém!

* A inovação como função da matemática, ou seja, a matemática mostrando novos caminhos.